A última fogueira ...

Caminhando ao acaso

vou dizendo palavras,

algumas cheias de tudo,

outras sem nenhum sentido,

na esperança que chegue aquela magia

que cubra de flores o meu caminho,

e o ar que se cruza comigo traga 

o sonho e o canto.

Que o inspirado descubra meu mais profundo desejo,

 deixe o mar só para mim,

e o barco que sai

um dia também volte.

E quando toda a ilusão me abandonar

e a realidade tomar de assalto o seu lugar

o sonho que acenda a última fogueira

e queime as tristes mentiras que sonhou.

Nani Carvalho

Entrego ao Mundo a Rosa...

E de todas as Primaveras 

esta vem com a ilusão 

do trevo de quatro folhas

do Malmequer e seu jogo.

O dia terá mais luz do que até aqui

e de costas para a sombra

sacudo o vazio.

No impulso da brisa 

ouvem-se as notas de Chopin,

 à noite o som das rãs

que assassinaram a chuva.

Pálida é a lembrança

do naufrágio das outras Primaveras

em que se pescava a vida no mar

e se encontrava na noite apenas

 a voz do mendigo e do seu abismo.

Para que merda isto afinal serviu?!

Rio, sorriu e canto,

 entretanto,

danço a valsa e encontro o poeta,

entrego ao Mundo a Rosa

e vejo-me

 como fui em tempos.

Nani Carvalho

Ninguém nos ensinou...

Era a hora das estrelas,

e eu não sei se o teu sonho vive na mesma do meu,

 falta alguma coisa a estas noites,

não fosse esta incerteza

e eu estaria naquela que sempre imaginei,

onde o que devo em amor,

pagasse em vontade de amar.

Quem sabe os amantes inventem

novas noites

e luas loucas...

Ouve-se o canto à porta do bordel

ali não há quem ame nem odeie,

aprende-se com a noite

a escutar o silêncio das bruxas

e ouvir o pranto dos morcegos.

Tudo morrerá um dia,

 ninguém nos ensinou como oferecer uma flor sem a cortar

nem como nos despedirmos do que doí.

Nani Carvalho

https://oaromadaalma.blogspot.com

Há sons assim...

Há sons assim...

Chegam e prometem a Lua,

consertam a imagem rota do meu sonho

e eu recordo,

as conchas que juntos devolvemos ao mar

as noites de luar

e o eco do rumor da madrugada.

Há sons assim...

eles podem parar o tempo,

fazer das palavras ao ouvido

a festa e o segredo

e no silêncio os gemidos.

Há noites que chegam

e prometem o impossível,

faço então de conta que o tinha previsto

e deixo espaço para o resto do poema.

Nani Carvalho

Ela calçou as sandálias....

A luz adormece sobre a montanha,

os fantasmas perdidos

 escondem-se atrás das árvores.

A madrugada passeia de mão dada com a fantasia

e no meio do caminho encontram o sonho.

Juntos descobrem uma estrela feliz.

Cúmplices ,

guardam o que não caberia em mais nenhum lugar.

Ela calçou as sandálias e sorriu

 enquanto sentia o delicioso sabor das coisas de longe.

Nani Carvalho

Um pedaço de sonho...

 Tento encontrar alguém parecido contigo,

passo a vida nisto,

nas ruas,nos lugares do costume,

 fontes,

praças antigas,

 vielas e caminhos.

A rua é o único lugar onde não me sinto intrusa,

tudo muda constantemente,

meu é o horizonte,

 os pássaros e as palavras,

a minha vida tem sido passada a convocá-las,

mas elas não parecem deste mundo ...

É melhor ir-me embora a tempo

antes que um poema,

ou uma velha canção da infância

me lembrem algum aroma esquecido.

Desanimada

mas com a dignidade de um resto de esperança

acariciava cansada um pedaço do sonho.

Estou em casa,

eu vivo onde mora a poesia.

Nani Carvalho

A lenda...

Foto: Eduardo Portugal

Corro, corro até onde o mar deixa o teu carinho

e enche de musica os meus aromas,

e assim deslumbrante

chega a Lua,

onde o amor deixa sempre a sede escrita.

E aconteceu que o Mundo

debaixo dessa noite que começava

tirou os sonhos do seu sitio,

e espalhou-os até de madrugada.

Mas foi naquele amanhecer

misturado de cores e de flores .

cheio de nuvens e buracos invisíveis

que caiu a chuva

e envelheceu a alegria.

Eu estranhei... 

Foi a lenda,

a lenda que conta os segredos da noite

e ri dos sonhos e do Mundo.

Nani Carvalho

Tibau do Sul...

E antes que me esqueça de dizer,

gosto quando me olhas escondido

e depois desapareces.

A tua ausência

 é uma união definitiva 

e aqui tudo é proibido,

até mesmo a amargura.

Que silêncio este o do piano,

 cantava canções sem palavras...

Tens que aprender a afastar-te

sem depois dizeres onde estiveste.

Olha mais uma vez este momento,

ama-o

e pensa que estás onde tudo começou .

Nani Carvalho

https://www.blogger.com

Fica...

Queria oferecer-te a Primavera,

 escrever um poema ao teu olhar

que me lembra o futuro.

Deixo-te a noite,

com fadas e duendes

e um mar de sonhos

onde apenas uma virgula os separa.

Fica,

como ficam as estrelas presas em nada.

O que quero recordar é uma rua,

deixar a minha sombra na esquina da tua casa,

e espalhar na entrada do portão

as pétalas que recolhi

de outras Primaveras.

Nani Carvalho

a carícia da voz...

A noite em que te amo

a mais pura e serena de todas as noites

enchia-se dos ecos da tua voz ao meu ouvido

sentia-se espalhado no ar

um leve cheiro a rosas

apenas um minuto, um só, e o nosso Mundo cruzou-se

esse minuto predador

que há tanto tempo nos ronda

Nani Carvalho

A saudade do riso...

Porque vistas as coisas desde o mar

pensando naquilo que se ama

mordendo os risos de outrora

tu nunca deixaste de estar em todo o lado.

Pensando naquilo que se ama

deixando que se escape a saudade

tu nunca deixaste de pertencer aos momentos felizes.

E quando as palavras roucas e cansadas

 deixarem apenas ficar a voz

pergunto :

e como falaremos nós quando ficarmos velhos?!

Nani  Carvalho

Procuro o que não existe...

Procuro alguma coisa para amar antes que anoiteça,

não quero saber de palavras,

 elas tomam conta do que não lhes pertence,

devolvem consciência quando apenas quero emoções.

Já nada está no que sonho e olho

talvez porque já não haja nada para olhar,

 nos sonhos acabaram as sensações

talvez porque tenham acabado também os sonhos.

Procuro alguma coisa para amar ao amanhecer,

continuo a não querer saber de palavras

basta-me o som da vida a acordar

Nani Carvalho

"Agora pode ser"

Luanda...

Desceu até à marginal com a ânsia de quem vai ao encontro do seu grande amor,
as pernas tremiam,o coração parecia saltar pela boca.
Tinha acabado de aterrar,quando as portas do avião se abriram e pousou o pé no primeiro degrau da escada ficou colado ao chão.Olhava à sua volta,inalava ar como quem não consegue respirar,chorava incontrolada sem saber se de felicidade ou medo,a saudade doí,então se calhar chorava de dor.
Segundos depois deste impacto brutal, foi o reencontro com os cheiros, do calor,da terra,da brisa e da chuva.
Resgatava assim a emoção do que sentiu nestes 40 anos que as mantiveram separadas .
O final da tarde reflectia todo o seu esplendor naquela água azul e calma embalada de sonhos e recordações ,
as luzes que entretanto se acendiam lenta e ritmadamente projetavam as sombras naquela baía mágica
e deixavam no lugar de sempre as fantasias e lembranças,
como se uma a uma elas voltassem ao que sempre foram.

Esta cidade é minha,gritou!!!

Nani Carvalho

O mar e a minha estrela...

 Moves o tempo da vida sem horas,

os meus versos já cabem no teu abraço,

que fora dele não fique

o sol e as minhas estrelas,

e tu sombra descuidada

que nunca apagues as palavras.

 Naquele mar azul

onde nadam felizes

a tua voz e a minha canção

há estrelas a nadar também.

Será que já nada se mantêm no seu lugar?

Perto de alcançar o coração daquela estrela

despedi-me dela 

e deixei-a junto ao mar

Nani Carvalho

in "Agora pode ser"

O fogo e os cheiros...

Seguiu o seu caminho e levou-me os olhares

há-de chegar àquele antigo ribeiro

e cantará tudo o que amo

a rosa colorida

o fogo

o aroma a canela.

As memórias chegarão

umas atrás das outras

sem mais idade do que a esperança

andamos a amar as velhas coisas

uns fazem versos e amam

outros sem sonhos, parece que morrem.

Espero sem prazo nem tempo

sem medos das noites e tempestades

a rosa colorida 

e o fogo

o encontro no jardim

 que fica ao pé do velho ribeiro

onde me devolves os olhares

 e me levas pela mão.

Nani Carvalho